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domingo, 22 de março de 2009

Um mundo verde e laranja

No outro dia (...acho extraordinário o emprego desta expressão, já a vi ser utilizada para referir algo que se passou há anos, assim como coisas que não aconteceram há mais de umas horas, mas continuando...), ontem, enquanto andava a passear por uns blogs deparei-me com uma afirmação que cativou a minha atenção: "Quem passa pela vida e não sofre, passa pela vida e não vive."

Ora faz-me confusão, não que o autor do texto tenha recorrido a esta frase mas, que se viva com este pensamento. Se calhar num mundo utópico verde e laranja (só porque acho que fica mais giro do que cor-de-rosa - era um bocado piroso!) não teríamos de sofrer para poder desfrutar das coisas boas da vida. Que raio de obrigação essa! O facto de dizer que, se não se sofrer não se vive, implica uma obrigatoriedade de sofrer para que nos possamos, como que, classificar como seres vivos. Afinal de contas o “viver” não é exactamente dispor das coisas e sensações maravilhosas que o mundo e as pessoas têm para nos oferecer?

Ou então se calhar tenho andado enganado. Principalmente se pensarmos na efemeridade da vida como a conhecemos, seria muito mais proveitoso se a aproveitássemos enquanto dura. Mas "Se queres ser alguém na vida tens de sofrer!”, ouvi isto há coisa de uma semana numa conversa entre amigos, colegas profissionais. E tenho de dizer que esta afirmação me revolta um bocado. Assim em números muito redondos, imaginemos que a esperança média de vida deste grupo de pessoas que conversava era de 85 anos. E se pensarmos em três grandes fases da vida, teremos a fase de "crescimento" (nascer, crescer, aprender, etc.), depois teremos a fase "estável" (nesta temos uma profissão, família, os amigos e os hábitos que se mantêm pouco mutáveis, o que não significa que a aprendizagem cesse) e por fim a última fase, uma "nova infância" (onde, não que a família se torne mais importante, mas o emprego será cada vez menos, aparece a reforma, dá-se lugar aos mais jovens e aproveitamos o resto da vida despreocupados, dentro do possível). Continuando com as contas redondas, se dividirmos essas três fases igualmente pelos 85 anos, ficamos com três fases de cerca de 28 anos e 4 meses cada. O que, se formos a ver não bate assim tão mal no tal mundo verde e laranja, vejamos:
  • Fase de "crescimento" dos 0 aos 28 anos, onde vamos aprender a andar e falar, conhecer os hábitos mais básicos do ser humano. Entrar para a escola aos 6 anos, prosseguir com os estudos e entrar para a universidade aos 18. Sair de lá, passados 5 anos, com o grau de mestre idealmente aos 23 anos, ais quais se somam uns 3 anos para eventuais anos de menos estudo e mais álcool, especializações e percalços que possam existir. Assim aos 26 anos sai-se com um canudo na mão e de estágio concluído, pronto para fazer parte do mundo profissional mais a sério. Dá-se ainda dois anos para adaptação no sítio onde se é colocado, arranjar um lugar para por a trouxa (ainda que alugado) e a primeira fase está concluída, por assim dizer, aos 28 anos.
  • Fase "estável" dos 28 aos 56 anos, já com emprego (que pode ou não mudar), terminar ao fim de uns anitos, se ainda não estiver terminada, a vida mundana a nível socio-relacional, estabelecer e criar família ao mesmo tempo que se cresce e evolui naturalmente a nível profissional. Já fora do ambiente estudantil, idealmente desde os 23/24 anos mas, admitindo que coisas correm menos bem, desde os 26 anos, o processo de aprendizagem forçada será agora diferente, ocupando uma fracção muito menor da nossa vida. Sendo que antes as atenções estariam (quase) todas viradas para o estudo, agora há a família, o emprego, o lazer com os amigos. Será então dentro do emprego que vai haver espaço para o desenvolvimento profissional, obviamente que não se pretende que se estagne a nível de conhecimento, mas essa evolução será parte do emprego e não da família ou lazer. À medida que nos aproximamos dos 56 anos, a carreira não terá muito mais portas para abrir, não por se atingir o máximo do conhecimento mas porque a estrutura profissional não é infinita e o espaço para crescer já foi, agora cada vez mais nos centramos na família, amigos e lazer, sendo a parte profissional algo bastante estável. Assim é permitido que se viva sem que se esteja a sofrer, a penar, em constante esforço para se ser alguém, apenas com o objectivo de ser mais, porque sim. É possível evoluir em vários campos ao mesmo tempo que se usufrui das maravilhas verdes e laranjas.
  • Fase da "nova infância", a última fase que irá dos 56 aos 85 (em média), a reforma está a bater à porta. Muito daquilo que sabemos já devia ter sido passados às novas caras, mas ainda há um tempinho. Como que um vendedor ao fim do dia, a fechar a loja que vendeu. Vai arrumando as prateleiras enquanto explica e relembra uma última vez ao novo dono alguns procedimentos e costumes, as dicas e a sapiência que apenas a experiência traz. Tudo isto para no dia seguinte ir à loja com um olhar diferente, o olhar de quem está do outro lado, a loja que conhece tão bem ou melhor que as próprias mãos já não é dele. Agora há-que aproveitar para ver todas as lojas que os 56 anos das fases anteriores não lhe permitiram. Sem o emprego a “chatear” agora todas as atenções se podem voltar para amigos e família, juntando todos no lazer, viver livremente, continuar a aprender, pois conhecimento nunca ocupa lugar (mesmo que a amnésia nos impeça de lembrar o nome do vinho que se bebeu ao almoço), ensinar aos netos as coisas boas da vida e prepará-los para as coisas más. E passados estes 85 anos, deixar o mundo para que os novos, continuem aquilo que se deixou.
Agora aquilo que é a minha maior dúvida é se será justo, racional, inteligente ou mesmo necessário passar duas fases a “sofrer” para depois ao fim de 56 anos de vida, aí então começar a pensar em viver despreocupadamente e apreciar a vida? Não será a melhor fase para aproveitar o mundo, a do meio, onde se consegue conjugar a juventude com a maturidade.

Uma última palavra para quem acha mesmo que é preciso sofrer para se viver. Sendo isso verdade, o recíproco também o seria, “quem não vive, não sofre”. Desenganem-se essas almas pois, não haverá pior sofrimento que o de não poder viver.

Bem hajam

4 comentários:

Anónimo disse...

Bem , se se voltasse a ler os clássicos, sobretudo Montaigne, saber-se-ia que o fim último da vida não é a excelência, mas sim a felicidade.

Muitas e muitas vezes é a excelência ou todo o esforço para ser o melhor, às vezes à custa de muita insanidade q traz o sofrimento.
Mas superar-nos, sermos capazes de dar o nosso melhor, de fazer bem, de sermos bons, por motivação própria, por gosto, pode dar-nos uma recompensa muito próxima da felicidade.

angels_wings disse...

ola Dioguito.. concordo ctg qdo dizes que pra viver n é necessario ser em sofrimento!! No entanto, o sofrimento traz-nos maturidade e calo, pra ultrapassarmos outros obstaculos que aparecerao na vida!! ate pk todos nos sofremos, ate mesmo aqueles que achamos "têm tudo pra ser felizes"
Ja pra n dizer que quem passa por essas contrariadades da vida, e têm de lutar bastante pelo que querem, no fim tem mto mais sabor e valor!! o ser humano é assim, e tudo o que é dficil tem mais "gosto", apesar que mtas vezes no momento nos sintamos desesperados, no fim temos aquela sensaçao de "objectivo cumprido"!!
acho que é mais nessa prespectiva que essas pessoas falam!!
beijocas ;)

Anónimo disse...

Thanks :)
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Unknown disse...

Desde o nascimento que a integração numa cultura e numa sociedade nos provocam dor. As frustrações, as expectativas, a própria aculturação ou sujeição social provocam dor. Creio que daí advém a crença de que é necessário dor. No entanto, não creio que se deva confundir dor com sofrimento. A dor é inevitável, o sofrimento é opcional.